CRÍTICA | INVOCAÇÃO DO MAL

Paulo Ricardo Cabreira Sobrinho
15 de set. de 2013
7 min de leitura

Atualizado: 29 de ago.

Originalmente postado em 2013. Atualizado em 2025.

O terror, provavelmente, é o gênero mais popular entre o público geral – aqui no Brasil, principalmente -, e podemos dividi-lo em dois tipos: os suspense/terror psicológicos (filmes que exploram os estados psicológicos da mente), com uma trama mais complexa, desenvolvida - esses raramente são lançados nos cinemas, e que atualmente pertencem ao estúdio A24 -, e os terror mais comerciais, ou os “terror fáceis”, com sustos básicos, clichês típicos, e uma trama rasa e mal desenvolvida. O filme em questão, Invocação do Mal, pode ser considerado um terror mais comercial, tem todos os clichês possíveis do gênero, e a trama é bem comum - um caso de possessão demoníaca -, e ainda se passa em uma casa mal-assombrada, mas a forma que o diretor James Wan - que ficou mais conhecido com o primeiro filme da franquia Jogos Mortais, em 2004, e Sobrenatural, de 2010 - conduziu todos esses clichês, o tornou superior aos outros filmes básicos do gênero.

"The Conjuring", no original, é baseado em uma história real de um dos casos do casal Ed e Lorraine Warren, que são conhecidos como "investigadores paranormais", entre outros nomes, onde ajudam uma família que é assombrada por um espirito demoníaco. A trama se passa em 1971, mostrando o casal Roger (Ron Livingston) e Carolyn Peron (Lili Taylor) se mudando para uma casa de campo com suas cinco filhas. A medida que eles vão se instalando, situações estranhas começam, e essas assombrações acabam chegando a um nível em que eles não sabem o que fazer. Para tentar entender o que está acontecendo com sua família, Carolyn procura o casal Ed (Patrick Wilson) e Lorraine (Vera Farmiga) para ajuda-los. Lá, o casal descobre que eles estão sendo atormentados por uma antiga bruxa satânica, e eles terão que enfrentar os maiores perigos de suas vidas para ajudar a família. Joey King e Mackenzie Foy também estão no elenco.

Invocação do Mal é um filme brilhante, assustador, e veio para figurar entre os melhores filmes de terror do cinema. O longa já começa tenso, explicando um pouco sobre a lenda da boneca Annabelle, que viria se tornar uma franquia a parte, e nos apresentando o casal Ed e Lorraine Warren. A trama é simples e nada de tão diferente no que já vimos em diversas produções (assombrações e possessão demoníaca), e é repleta de clichês típicos de filmes que se passam em casas mal-assombradas - portas se fechando sozinhas, sons estranhos ecoando pela casa, o som do chão rugindo, cenários escuros, porões escondidos, aparições de espíritos, crianças agindo estranhas e sendo arrastadas -, e claro, os sustos para quem gosta. Mas então, porque Invocação do Mal é um dos melhores filmes de terror já produzidos?

James Wan cria uma ambientação que realmente impressiona, especialmente a casa onde a família Perron se muda: os quartos, o porão, os corredores secretos, até os móveis antigos casa, tudo ajuda a criar um clima assustador e inquietante. O lado de fora também é bem sinistro, rodeado de árvores (uma em específica merece atenção), e por um lago que não é muito utilizado na trama. Tudo isso são elementos clichês e básicos em um filme de terror, mas a diferença é que aqui são brilhantemente dirigidos por James Wan, criando uma atmosfera tensa e misteriosa durante o filme inteiro. Wan também é eficiente em criar situações assustadoras com as cenas de assombração e as aparições das entidades, muitas vezes usando a técnica da sugestão: o público não vê as entidades, mas os personagens sim, da mesma forma quando algo acontece com os eles. A tensão vai crescendo aos poucos, e quando os fantasmas realmente aparecem em situações inesperadas, os sustos são garantidos. Outro detalhe é quando Ed e Lorraine explicam sobre os casos de possessão, e suas experiências com os exorcismos, como se a gente estivesse em uma aula sobre atividades paranormais do casal, e isso só aumenta a imersão do espectador.

Para um filme funcionar, o elenco e as atuações precisam cativar o público. Felizmente, Invocação do Mal consegue fazer isso. Os Perron são uma família simples, passando por problemas como qualquer outra, e juntando com o carisma dos personagens, a identificação do público fica maior ainda. Lili Taylor, que atuou em A Casa Amaldiçoada, é Carolyn, uma mãe com uma extrema sensibilidade e fragilidade, chegando ao desespero de não saber o que fazer para ajudar a família. Ao contrário do que geralmente acontece, o patriarca da família, Roger, se sente familiarizado com o que acontece, fugindo do clichê do pai que não acredita no que está acontecendo. Os filhos do casal, que são cinco, tem personalidades diferentes, uma mais cativante do que a outra, e já são cinco vez mais chances de o demônio atormentar. Para dar vida ao casal Ed e Lorraine, foram escalados aos atores Patrick Wilson e Vera Farmiga, que tem uma química incrível e comprovam que foram as escolhas perfeitas para os papéis, como se um completassem o outro. O carisma dos dois é impressionante, e conseguem passar isso para o público. Patrick Wilson já trabalhou com James Wan em Sobrenatural – Capitulo 1, que esse ano também vai estar na continuação, e Vera Farmiga, que já sofreu nas mãos de uma menina que se passava por adulta, em A Orfã, também participou de Contra O Tempo e Os Infiltrados.

Curiosamente, a verdadeira Lorraine Warren participou da produção do longa, orientando Vera Farmiga sobre a sua personagem e dando sugestões, principalmente sobre os acontecimentos na casa da família Perron, tudo com sua provação para ser usado no longa. Invocação do Mal é um dos melhores filmes de terror já lançados , e ao longo das quase duas horas, o filme consegue ser convincente, assustador, com cenas de assombração realmente impressionantes, e a sequência final de exorcismo é intensa e muito bem produzida, com todos os elementos de filmes de exorcismos possíveis. A direção de James Wan é eficiente, mesmo com os clichês típicos de filmes de casa mal-assombrada - que são bem trabalhados no roteiro -, funciona perfeitamente, e a ambientação dos anos 70, os cenários da casa, até a trilha sonora mais exagerada, aumentam a imersão do público com a trama. Diversão na certa. E uma curiosidade: no desfecho, Lorraine recebe uma ligação para investigar um caso em Long Island, que vem a ser os eventos assustadores em Amiytville, do filme Horror em Amityville, de 1979.

| O CASO REAL DE INVOCAÇÃO DO MAL |

Invocação do Mal é baseado em um caso real de Ed e Lorraine Warren - dois investigadores paranormais -, que aconteceu nos anos 70, quando eles ajudaram a família Perron a tentar se livrar das assombrações. Claro que o filme teve liberdade criativa para fazer algumas mudanças, mas a história e os acontecimentos basicamente são praticamente os mesmos. Um exemplo é a cena de exorcismo no final: Carolyn realmente foi possuída, mas não foi preciso realizar uma sessão de exorcismo para expulsar o espírito.

Carolyn e Roger se mudaram para uma enorme casa de campo na região de Harrisville, em Rhode Island, com suas cinco filhas, no início da década de 70, e não demorou muito para que as assombrações começassem: as crianças acordavam durante a noite, afirmando que ouviam vozes estranhas pela casa. Em seguida, fenômenos paranormais assolaram a família, como objetos da casa levitando e voando pela casa, chão rugindo e portas batendo, além de aparições de entidades dentro de casa e ao redor da propriedade, atormentando-os durante meses. A família Perron acabou descobrindo que várias gerações de uma mesma família moraram naquela casa, passando por situações similares a deles, além de assassinatos e suicídios – inclusive de crianças -. A situação piorou quando Carolyn começou a ser atormentada e depois possuída por uma entidade maligna, e após investigações, descobriu-se que se tratava de uma mulher chamada Bathsheba Sherman, que viveu em meados do ano de 1800, e que diziam ser uma bruxa satanista que sacrificou crianças para oferecer ao diabo. No final, Bathsheba se enforcou na propriedade – no filme, foi em uma árvore tenebrosa -.

E foi aí que os Warren entraram em cena para ajudar a família. O casal os ajudaram de diversas formas, como sessões espíritas para conversar com as entidades que atormentavam a família. E ao invés de uma sessão de exorcismo como o filme mostra no final do filme, uma das filhas do casal, Andrea, revelou que isso nunca aconteceu, só mesmo uma sessão espírita em específico que não funcionou. Em Invocação do Mal, Ed e Lorraine conseguiram expulsar a entidade da Batsheba de Carolyn, mas na vida real foi diferente: após diversas tentativas durante alguns anos, os Warren acabaram desistindo para preservar a saúde mental dos Perron, e a família ainda ficou morando na casa até meados de 1980, quando decidiram se mudar.

Ao longo dos anos, os Perron tiveram uma vida “normal”, onde uma das filhas da família, Andrea, escreveu um livro sobre os acontecimentos que presenciou na época, e que também serviu como base para fazer o filme, - inclusive Lorraine Warren ajudou na produção de Invocação do Mal, da mesma forma que os Perron também participaram -. Ed Warren acabou falecendo em 2006. Poucas famílias moraram na fatídica casa em Rhode Island, mas não relataram nenhuma atividade sobrenatural significativa. Curiosamente, a penúltima dona da casa revelou que viveu tranquilamente durante anos, até o lançamento do filme, em 2013, alegando que fãs do filme iam diversas vezes até o local. O último dono que comprou a casa relatou que as assombrações voltaram a acontecer, e ele decidiu manter a casa em Rhode Island como uma atração histórica para visitas.

Atualmente, não se tem muitas informações sobre a família Perron, mas até alguns anos atrás, somente a filha mais nova, April, havia falecido em 2017 devido a uma overdose acidental de medicamentos. Carolyn e os outros membros da sua família ainda estavam vivos. Inclusive, eles ajudaram na produção de Invocação do Mal, fornecendo arquivos e gravações dos acontecimentos. O casal de investigadores paranormais já faleceram: Ed Warren em 2006, e Lorraine em 2019. E assim como os Perron, Lorraine Warren também supervisionou a produção do filme, e teve até mais participação.